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  • Clara Padilha

* Artigo comentado: The effects of anabolic androgenic steroid abuse on gingival tissues.


Hoje o artigo é pra quem gosta das relações farmacológicas do esporte. Vamos estudar "O efeito do abuso dos EAA nos tecidos gengivais", por Onur Ozcelik M. Cenk Haytac Gulsah Seydaoglu, publicado no J Periodontol., em 2006.

Bora!

Pra começar, importante entender o que são os esteróides anabolizantes: são uma classe de hormônios esteroides naturais e sintéticos que promovem o crescimento celular e a sua divisão, resultando no desenvolvimento de diversos tipos de tecidos, especialmente o muscular e ósseo. As principais razões para a utilização dos EAAs são aumentar o tamanho do músculo e/ou reduzir a gordura corporal, realizar exercícios frequentes, de alta intensidade e de longa duração, e melhorar o desempenho nos esportes.

São substâncias geralmente derivadas do hormônio sexual masculino, a testosterona, e podem ser administradas principalmente por via oral ou injetável.

Os efeitos adversos do abuso de EAA dependem da idade e sexo do indivíduo, duração de uso, dose e tipo de esteróide ou precursor utilizado, e incluem toxicidade hepática, elevação dos níveis plasmáticos de lipoproteínas de baixa densidade, parada do crescimento, hirsutismo, acne, alterações emocionais como comportamento agressivo e depressão, diminuição da contagem de testosterona e espermatozóides endógenos e ginecomastia em homens e interrupção do ciclo menstrual em mulheres.

Os achados deste artigo revelaram que o uso prolongado de EAA está intimamente associado a níveis significativos de aumento gengival.

Como atualmente os EAA não são utilizados somente por atletas profissionais, mas também por pessoas que desejam uma melhor aparência estética, inclusive adolescentes, cirurgiões-dentistas e periodontistas devem estar familiarizados com os efeitos adversos desses derivados sintéticos da testosterona nos tecidos gengivais.

Mas como esses pesquisadores encontraram esses achados?

O grupo estudado era composto de 24 fisiculturistas e levantadores de peso (não profissionais), entre 17 e 29 anos, que usavam EAA por mais de um ano. Eles foram clinicamente examinados quanto aos níveis de placa (índice de placa), inflamação gengival (índice gengival) e aumento gengival. Os resultados foram comparados com um grupo controle de 20 fisiculturistas que nunca haviam usado drogas AAS e que combinavam por idade, nível educacional e hábitos orais, de acordo com os dados obtidos do grupo de teste.

Não existiram diferenças estatísticas entre os escores índice de placa (P> 0,05) e índice gengival (P> 0,05) entre o grupo de estudo e do grupo controle, mas os usuários de EAA apresentaram escores estatisticamente maiores de espessura gengival, extensão da invasão gengival e escores totais de aumento gengival (P <0,001 cada) em comparação com não usuários.

Minha maior dúvida em relação a este artigo é o que os autores consideram como "abuso" da substância. Não encontrei em nenhum momento do método uma quantidade, forma de administração ou tempo de aplicação que caracterizasse esse "abuso" ou o que pra eles seria uma dose "adequada" a ponto de não causar consequências gengivais. Ou qualquer quantidade já geraria essa manifestação bucal? Leia o artigo original e veja o que você interpreta e me conta.

Estudos sobre as consequências do uso do EAA em atletas tem diversas limitações metodológicas que devem ser consideradas na nossa análise.

Pra começar o número suficiente de sujeitos de pesquisa que podem ser avaliados, bem como as variações das formas de administração das substâncias e dosagens diferentes que cada atleta pode assumir. Outra situação que prejudica a avaliação direta é um método chamado de "stacking" (empilhamento), que significa que eles estão usando a medicação por diferentes vias administrativas: por via oral, parenteral e tópica, nas formas injetável, comprimido e em gel, para melhorar ou acelerar os resultados, o que prejudica uma avaliação direta das consequências do uso de uma única substância. Também deve ser considerado o fato de que essas substâncias, por serem ilegais em alguns países, podem ser adquiridas no "black market" e portanto sem controle de qualidade.

A interação entre testosterona e seus derivados metabólicos com a formação de fibroblastos gengivais ainda não é totalmente esclarecida na literatura. Nesse estudo (embora não estatisticamente significativa), a inflamação gengival foi maior no grupo de usuários de EAA em comparação com o grupo controle. Neste ponto, não se sabe se uma inflamação gengival preexistente em usuários de AAS aumentaria o risco de desenvolvimento de aumento gengival. Mais estudos são necessários para descobrir se os maiores escores do índice gengival no grupo de estudo são um efeito direto do AAS ou se a inflamação é um resultado da higiene oral ineficaz limitada devido ao aumento gengival.

Embora tenha sido relatado que muitos dos efeitos adversos do abuso de AAS são totalmente reversíveis dentro de alguns meses após a cessação da droga, não se sabe se o aumento gengival também regrediria após a retirada do AAS (pois ninguém acompanhou isso ainda). Além disso, o abuso de EAA também está associado a vários efeitos psiquiátricos e comportamentais, como depressão, mania, psicose e agressão, circunstâncias psicossociais que têm sido indicadas como fatores de risco significativos para a doença periodontal, e a relação desses fatores e a doença periodontal em usuários abusivos de EAA deveriam ser analisados ​​em estudos posteriores.

Acredito que este é um nicho de pesquisa com imenso potencial dentro da Periodontia e da Odontologia do Esporte que deve ser melhor explorado pelos dentistas cientistas. E você pode começar hoje mesmo, aqui embaixo eu separei mais dois artigos para você continuar estudando sobre esse tema, boa leitura!

 

Outros artigos para auxiliar no seu estudo:

  • Soory M. Hormonal factors in periodontal disease. Dent Update 2000; 27: 380–383.

  • Soory M. Targets for steroid hormone mediated actions of periodontal pathogens, cytokines and therapeutic agents: Some implications on tissue turnover in the periodontium. Curr Drug Targets 2000; 1: 309–325.


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